terça-feira, 12 de abril de 2011

A tragédia em Realengo

O triste acontecimento da semana passada deixou todos nós perplexos, tamanha foi à crueldade do assassino. Um clima de velório tomou conta do país. Os relatos de que o homicida apontava preferencialmente à cabeça das crianças nos faz imaginar diretamente nossos filhos e entes queridos em tal situação. Com uma frieza incomensurável, o jovem atirou em inúmeras crianças. O autor da tragédia tinha características semelhantes aos psicopatas – anti-sociável, fechado, infeliz sexualmente. A humilhação do “bullying” somado ao fanatismo religioso são destacados como possível explicação para o desequilíbrio do autor dos disparos. Muitos defendem que caso houvesse um policial guardando a Escola nada disso teria acontecido. Argumento que eu discordo dada à premeditação do matador, ele teria assassinado o policial da mesma forma cruel que o fez com as crianças. Sendo assim, o que inquieta é a pergunta: Como evitar fatos lamentáveis como esse? Acredito que não exista medida que iniba tal comportamento, esse jovem vem alimentando esse sentimento de ódio e loucura por muito tempo e planejou tudo – é só atentar para o fato dele estar portando dois revolveres e carregador de balas. Nesses momentos procuramos traçar paralelos com outros fatos semelhantes e nos vêm à cabeça os atentados nas escolas americanas. É um esforço para entender o que aconteceu, essa tentativa – que se torna um exercício inútil – nos limita à apenas rechaçar a crueldade de um jovem com sérios problemas estruturais. Quando despejamos toda a nossa indignação em acusações alimentadas pela mídia, não nos atentamos ao exercício da reflexão – O que realmente está acontecendo nas nossas Escolas? Continuamos caindo nas mesmas armadilhas do lugar-comum. O debate que cerca a sociedade se restringe em encontrar culpados e escanteia tudo que não seja voltado às acusações. É uma caça às bruxas com incentivo de 24 horas na televisão, radio, revista e jornal. Existe uma velha discussão de quem dá às cartas na relação entre nós e a mídia: Afinal, pautamos a mídia ou é a mídia que nos pauta? Diferentemente dos que pensam que existe uma troca e que o consumidor de informação tem muitas opções, eu não tenho dúvidas, a mídia pauta nossas vidas. Mas não somos capazes de refletir sem o auxílio/manipulação dos veículos de comunicação? Nesse momento de dor somos induzidos a buscar soluções paliativas, como se o problema de segurança e Educação fosse algo simples de se resolver. Podemos achar muitos culpados: A perda de valores da sociedade atual, os desencontros com Deus, a falta de estrutura da família, etc. No entanto, esquecemos que nós, como sociedade, exigimos um padrão único que tem no belo e no vencedor os seus modelos, humilhamos quem não se encaixa nessas características obrigatórias. Isso sem falar na cultura de aparências em que vivemos, segundo a qual todo mundo tem obrigação de andar na moda. São esses os valores mais fortes na sociedade atual, baseado nesses preceitos deixamos a Escola de lado. É simplesmente uma vergonha o que se paga para um Professor de Escola pública – para citar apenas um dos inúmeros problemas. Fazemos vistas grossas para essa anomalia, como se a Educação na Escola fosse uma mera fase da infância. Pois não é. Os valores que levamos por toda a nossa vida são implantados de forma decisiva na Família e na Escola e dada a rotina insana que vivemos hoje em dia, a instituição Escola deveria ser a mais privilegiada das instutições – Afinal é lá que estamos construindo as novas gerações e definindo o nosso Futuro como Sociedade. E nesse aspecto caímos novamente no lugar-comum quase que ingênuo de transferir toda a responsabilidade para o Estado. Vemos o governo como solução de todos os nossos problemas e o que é pior, no Brasil, o presidente tem status de Messias, o que irá salvar todos das injustiças e mazelas da vida. Simplesmte transferimos nossas responsabilidades de criar uma Sociedade mais justa com oportunidades iguais para todos. Continuamos a competição desmedida e cruel que é regida pela aparência e ostentação. Essa tragédia é uma oportunidade para refletirmos – se possível sem a intervenção da mídia - sobre qual Sociedade queremos: A do espetáculo, onde pão e circo – somadas à aparência – são indispensáveis ou uma Sociedade com valores calcados no respeito às diferenças e com a Educação como alicerce na construção das relações.

3 comentários:

André Braga disse...

Cara, esse caso expõe vários problemas ao mesmo tempo: falta de segurança, bullying, psicopatia, falta de estrutura familiar, compra de armas, influências de games e noticiários... Só espero que nós, sociedade, saibamos discutir com inteligência. Será complicado achar agora que toda criança que é quieta demais é um potencial psicopata.
Aproveitaram esse caso para rediscutir a questão das armas, o que acho "tapar o sol com a peneira" já que armas envolvidas em crimes são ilegais. E não é proibindo as legalizadas que os crimes irão diminuir.
Esse caso é uma chance de aprendermos a discutir as coisa de maneira profunda, e não malhando judas ou tapando sol com peneira, que é como geralmente acontece.

Paz às crianças de Realengo.

André Braga disse...

Outra coisa também: dias depois dessa tragédia, a presidenta Dilma lamentou, chorou e disse que o Brasil não trata assim suas criancinhas... Bem, vamos lembrar: Candelária, prostituição infantil, menores nas ruas cheirando cola, usando crack, febem lotada, falta vaga em escolas, creches, desvio de merenda, mães que trabalham o dia todo, pais alcoolatras... O Brasil trata muito, mais muito mal suas crianças. Esse caso de Realengo não é algo isolado.

Assisti ao programa dominical da record e aconteceu o seguinte: passou uma reportagem completa sobre o caso de Realengo, de forma bem maniqueista e indiretamente opinativa, chamando as vítimas de anjinhos. Logo em seguida passou um reportagem sobre a cracolândia e mostrou uma criança que aparentava entre 10 e 12 anos, no máximo, que com certeza teve aquele local como berço, e o reporte comentou: "olhem esse menor, que não é flor que se cheire...", cara, esse comentário, na minha opinião, traduz como tratamos nossas criancinhas.

Na boa, o Brasil está se desenvolvendo, mas o brasileiro, não.

Roberto Geronimo - Beto disse...

André, acredito que todos esses problemas citados por vc são reflexo dos péssimos governos. São muitas as mudanças a serem feitas. Uma mudança de postura da classe média seria importante. As pessoas que tiveram acesso à Educação devem exercer liderança no país e não se preocuparem com seus próprios umbigos... O exemplo vem de cima.